É
que de quando em vez a gente fica triste, sabe? Assim, triste. Macambúzio,
cabisbaixo, taciturno. Amuado sem mais o quê. Acontece. Acontece com todo
mundo. Quem nunca sentiu tristeza? Há de haver neste mundo quem jamais se viu
aborrecido e achou que ia ser para sempre?
Eu
fico triste. Quase sempre. Depois passa. Mas eu fico. E acho uma bruta covardia
que o mundo nos cobre felicidade o tempo todo. Não dá. Tem horas em que a gente
se aborrece. Daí vem alguém nos apontar o dedo, o queixo, o olhar superior e
dizer “vai lavar a louça que passa”.
Acontece
que talvez eu não queira que passe assim, com a espuma da louça enxaguada.
Porque não se faz isso com visita nenhuma. “Senta
um pouquinho aí, dona tristeza. Eu vou ali ajeitar a casa e já volto papear com
a senhora, tá?”
Então
eu demoro um tanto lá dentro e quando volto me dou conta de que a tristeza,
cansada de esperar, já foi embora. Pode até funcionar uma vez. Duas. Mas não dá
certo para sempre. Uma hora ela agarra na sua perna e vai junto. Vai com você
lavar a louça, vai com seus tantos nomes. Agonia, mágoa, dor, desconsolo,
pesar, luto. Ficam todos ali, na gordura dos pratos sujos, na superlotação da
pia, na esponja envelhecida, no copo que escorrega de suas mãos ensaboadas e se
espatifa na vida. No desânimo de estar ali com você. Em você.
Aí
não tem jeito. É preciso sentar com ela e olhá-la nos olhos. Ouvir suas
histórias, saber seus motivos. Aprender que todo mundo uma hora há de ser
triste. E que a tristeza é nada senão uma crise. Crisálida gestando seu tempo
de ser borboleta.
Repare.
Toda gente feliz já sentiu tristeza em algum grau, de qualquer tamanho, cor,
intensidade. Ser feliz é conhecer a comparação. Quem já se viu triste valoriza
de fato os minutos de alegria que, somados ao longo da vida, talvez resultem em
felicidade.
Tem
gente abrindo mão de seu direito sagrado à tristeza. Cheios de medo, damos as
costas, fingimos que ela não existe e perdemos a melhor parte da felicidade que
nos cabe: o susto de sua chegada, a consciência de sua estada em nós. E isso é
o mais triste.
Quer
saber? Gente muito feliz o tempo todo me incomoda. Gênios superiores, seres bem
resolvidos insistindo em jogar sua alegria na minha cara, escancarar elevação,
impor sua felicidade como quem exibe um brinquedo novo. Só para farejar minha
névoa e escarnecer da minha incapacidade de ser como eles.
Eu
fico triste, sim. Vira e mexe, entristeço. Mas sabe o que é? Isso não faz de
mim pessoa infeliz. Ah, não faz, não.
Via: Resiliência Mag
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