Guimarães
Rosa dizia: “O que a vida quer de nós é
coragem”, e eu concordo plenamente, pois somos a sucessão de escaladas e
abismos, somos nossa tormenta e nossa redenção, o início e o fim de nossas
inquietações. Travamos batalhas interiores diariamente, e conseguir conduzir
nossos pensamentos, emoções e desejos a um lugar de paz é nosso maior desafio.
Outro
dia assisti a um vídeo do filósofo Leandro Karnal e me encontrei em suas
palavras. Ele dizia que o pensamento das mulheres é um pouco distinto ao dos homens
no que se refere à zona de conforto. Dizia que os homens são mais inclinados a
permanecer na zona de conforto, enquanto as mulheres procuram mergulhar mais
profundamente em seus sentimentos e emoções. Resumindo: somos mais inclinadas a
questionar, debater, trazer à tona aquilo que não é escancarado, mas não pode
ser sufocado.
Às
vezes, para conseguir escalar a cordilheira, a gente precisa recuar um pouco
para recobrar o fôlego. Assim também acontece que, às vezes, para seguir em
frente, precisamos nos reconciliar com nosso passado, com nossa história. Não
temer destampar antigos curativos para que possam ventilar; arriscar cair um
pouco para então se levantar; ousar desatar antigos nós para enfim continuar.
Olhar
para trás e encarar o que doeu, o que feriu, o que machucou não é simples e não
acontece da noite para o dia. Muitas vezes passam-se anos até que possamos ter
coragem de rever a dor, para que ela não nos defina mais. Permanecer na zona de
conforto nos protege, mas não nos ensina a transformar os cacos de vidro em
novos vitrais.
Às
vezes temos que dar um tempo nas linhas retas onde escrevemos nosso presente
para rever as linhas tortas que deixamos para trás. Quem sabe assim a gente
consiga acertar aquelas pautas também, nem sempre usando a borracha, mas
entendendo e perdoando o contorno daquilo que de alguma forma saiu dos eixos.
Só assim permanecemos livres e prontos para o que vem pela frente.
Eu
acredito que, na maior parte do tempo, somos as experiências que vivemos, as
pessoas que amamos, as saudades que deixamos, as escolhas que fizemos. Por
isso, tudo precisa estar em equilíbrio; qualquer linha solta, mesmo que no
início de tudo, pode modificar o desenho final. Muitas vezes preferimos não
saber, não lidar com isso, não cutucar o vespeiro. Mas ele está ali. Mesmo que
a gente não olhe pra ele, ele continua à espreita. Então é preciso coragem e
disposição para sair da zona de conforto. Para ousar retroceder e só então
alcançar o cume da montanha...