Depois
de um tempo fica difícil abrir o coração novamente, assim, de maneira
espontânea. As derrotas no jogo do amor ensinam a racionalizar alguns
sentimentos e, por este motivo, gostar de alguém não é tão simples como deveria
ser. Criamos barreiras, exigências, inventamos mil motivos, mais para o não do
que para o sim.
Meio
que por sobrevivência, se não sabemos, acabamos descobrindo atalhos para sermos
felizes sozinhos o tempo todo. Aprendemos as coisas que nos aliviam, que nos
deixam felizes, que nos acalmam, que nos distraem e que nos fortalecem.
Construímos um mundo particular confortável e uma cela quase intransponível
para o coração.
De
vez em quando aparece alguém batendo na porta, educadamente, querendo entrar, e
por mais que a pessoa mereça uma chance, às vezes entregar-se é custoso. Parece
cansativo sair do conforto de não sentir vazios no coração ou nós na garganta –
porque gostar de alguém às vezes causa estes efeitos colaterais – mesmo que
isso custe não morrer de amores nos finais de semana e levar uma vida sem
grandes intimidades. Pagamos o preço do não amar, às vezes com gosto.
Criamos
um medo enorme, mas ele não é de amar, nunca foi. O medo é de dar errado, de se
machucar, de se entregar à toa, de quebrar a cara e sofrer novamente. Com o
tempo ficamos fortes para a vida, mas frouxos para o amor. É como ter medo de
alturas, porque não se tem medo da distância entre o chão, mas sim da possível
queda.
E
nesse medo que acumulamos, passam algumas pessoas que poderiam ter valido a
pena insistir, mas até nisso, a motivação acaba. Lutar por alguém, doar-se um
pouco mais para que algo dê certo, custa um esforço danado. Insistir em alguém
parece exaustivo. Com o tempo ficamos práticos, se der certo ótimo, senão
adeus. Enquanto encaixa o jogo continua, se uma peça se perde, é melhor
substituir. O problema é que ficamos práticos demais.
E
meio contraditório, às vezes o medo é de dar certo. E se com esta pessoa
funcionar? E se eu for feliz de uma maneira que nunca imaginei que seria? Quem
me garante que desta vez a pessoa não irá embora? Quem me promete que as
atitudes dela me renovarão a cada dia?
Mas
a vida é este risco incalculável de incertezas, talvez a saída seja entregar-se
totalmente mesmo, sem limitações. Se quebrar a cara, quebrou, a gente compra
uma máscara enquanto concerta a cara. Se machucar o coração a gente foca no
trabalho, enquanto chora nos intervalos do almoço, enquanto as lágrimas vão
levando as decepções e a nossa coragem embora, mas a coragem a gente recupera,
traz de volta, e as decepções a gente transforma em aprendizado.
Depois
de um tempo é preciso muita coragem para sair dessa mediocridade de relações
superficiais. Talvez valha a pena encarar o medo, mesmo que a gente precise um
tempo de solidão e de calma no coração. É preciso criar um alarme para não
perder o horário de voltar a abrir o coração, de querer com ânsia os mais puros
sentimentos.
Mesmo
que não seja o momento, uma hora você precisa criar coragem para volta a subir
no andar mais alto do prédio, mesmo com medo, porque um dia a alma fica
inquieta e pede. E que este tempo seja para criar impulso e depois pular com
tudo, porque estar vivo só vale a pena quando podemos – com toda a sua
plenitude – sentir.